sexta-feira, 16 de novembro de 2012

A Maior Desilusão

Houve um tempo em que julgamos que a "nossa tribo" era a mais forte;  a "nossa cidade"  era a mais segura;  o "nosso Deus" o mais poderoso; o "nosso reino" o mais protegido pelos Deuses. E  a nossa Terra era o centro do sistema solar e mesmo o centro do Universo.

E agora até são legítimas as dúvidas sobre se existe apenas este universo ou uma miríade incontável de universos.

Mas dá para aguentar. Afinal, de alguma forma, as nossas expectativas iniciais acabam sempre ultrapassadas, apesar de a realidade não ser como a supúnhamos.

Nos últimos tempos, porém, foi medrando, com a emergência da era científica, a ideia da irremediável limitação do indivíduo e da pessoa, como se cada um de nós, homens, deixássemos de ser o centro da vida, num planeta que já não é  o centro do sistema solar e de uma galáxia que não é, de maneira alguma, o centro do universo.

Tudo aponta para conclusão de que, milhares de anos de história e de cultura, sejam resultado apenas de um cérebro mais complexo que evoluiu  até à consciência de si próprio. Legamos, por este facto, uma cultura mais enriquecida aos vindouros, mas da mesma forma que os outros seres vivos, a história de cada ser humano está limitada ao tempo curtíssimo de uma vida.
Isto não é dogma. Por enquanto, apenas um verdadeiro sobressalto para as filosofias e teologias de gente intelectualmente honesta, mais perplexa que escandalizada com uma realidade até agora insuspeitada, revelado pelas ciências.

À luz das ciências actuais, começa a desenhar-se este retrato de uma realidade cada vez mais deslumbrante para o homem, porém, parecendo reduzir o mesmo homem a uma insignificância no seio da vastidão dos universos.
Se conseguirmos recriar, em laboratório, a vida e a consciência da vida, não sei como poderemos escapar ao veredicto de que o nosso destino é coincidente com o destino das restantes formas de vida, cada uma evoluindo na sua especificidade.

Reconhecer que o indivíduo humano e a pessoa humana em nada transcendem a realidade onde emergiram,  está revelar-se o choque maior e não tenho dúvidas que será a maior desilusão para o homem, desde que acedeu à consciência e se julgou, a partir daí, receptáculo da imortalidade e destinado à eternidade.

Quase todos os teólogos e filósofos se agarram, em desespero de causa, ao facto evidente de que a "pessoa" não se identifica com o corpo-cérebro. Segundo afirmam, bem podemos dissecar o corpo-cérebro até à sua física nuclear, que não vamos lá encontrar vestígios da subjectividade pessoal. E se não a encontramos, mas as suas realizações são indiscutíveis, então a "identidade pessoal" tem de ser uma realidade.
E é, dizem outros pensadores, mas não dura mais que o corpo-cérebro onde se formou. Apesar de realizações prodigiosas a pessoa humana desintegra-se ao fim de uma existência frágil e breve.

Se a fé dos homens continua esperançada na vida depois da dissolução do corpo-cérebro, a ciência não só não acompanha essa crença, como parece afastar-se cada vez mais, eliminando os pontos obscuros um por um.

Por mim, penso que a imortalidade da identidade pessoal tão desejada desde há milénios é uma realidade do futuro. Isto quer dizer, exactamente, que tem de ser construída por nós.