segunda-feira, 1 de agosto de 2011

Conhecimento, Lógica e Indecibilidade

Que sentido faria resumir informações acerca da realidade se o conhecimento, em si mesmo, fosse impossível? Qual a validade de tecer um conjunto de considerações e raciocínios sobre a realidade se a lógica, ela própria, não existisse ou não estivesse ao nosso alcance? Coloca-se, pois, a questão de determinar se o conhecimento (1) e o raciocínio (2) são possíveis e ainda se estão ao alcance da mente humana, em particular (3). Curiosamente, pensando sobre estas questões, surgem de imediato outras questões cuja resolução prévia é necessária: independentemente da resposta a cada uma das questões 1, 2 e 3 ser sim ou não, há-que ter em conta que a validade da nossa análise a estas questões não é independente do seu próprio resultado: esta é uma situação muito particular, pois se a resposta for não a alguma das 3 questões, a nossa capacidade para determinar a resposta correcta a qualquer das 3 questões estará de imediato gravemente comprometida! Além disso, existe também a hipótese bastante razoável de, em geral, o conhecimento e o raciocínio estarem ao alcance da mente humana, mas tais ferramentas pura e simplesmente não se poderem aplicar a todas as questões, podendo haver algumas, pela sua natureza muito particular, que sejam inatingíveis (4). O Teorema da Incompletude de Godel, assim como, na computação, o Problema da Paragem de Alan Turing, evidenciam que nem todas as questões são decidíveis.

Conclusão intuitiva: Com elevada probabilidade, os problemas de determinar se o conhecimento e o raciocínio lógico são ou não possíveis são problemas indecidíveis (ou seja, é impossível decidir qual é a verdade, embora ela possa existir), pela simples razão de requererem, para a sua análise, o mesmo conhecimento e o mesmo raciocínio lógico cuja possibilidade pretendem demonstrar.

A impossibilidade de fundamentar logicamente a validade do nosso próprio raciocínio parece gozar de uma certa lógica... a única atitude coerente, portanto, parece ser esquecer a demonstração e apostar que sim!, que dispomos efectivamente da possibilidade de conhecer, raciocinar e, assumindo essa hipótese como base de trabalho, verificar se graves contradições começam a aparecer, que contradigam a nossa hipótese. Constata-se, afinal, que as aparências, ao invés, a sustentam. Se excluirmos as hipóteses mais paranóicas segundo as quais andamos a ser completamente ludibriados por entidades superiores que têm o propósito firme de nos enganar acerca de tudo o que os nossos sentidos nos indicam (e afins), resulta pouco provável que mentes de raciocínio nulo ou extremamente débil consigam fazer o tipo de previsões que nos são possíveis. Se a mente humana fosse uma estrutura de coerência frágil, as suas construções extremamente complexas provavelmente não resistiriam e enormes brechas já estariam abertas em todos os campos onde é utilizada. Concluindo: lamentavelmente, não podemos demonstrar com todo o infalível rigor matemático que a reposta às questões 1, 2 e 3 é sim. Teremos de nos conformar com uma situação manifestamente insuficiente: uma aposta na intuição, na crença, na fé - ainda que uma fé dramaticamente diversa da fé religiosa - pois que esta se enraíza justamente nas evidências observáveis e não no conhecimento sem fundamento. Continua a ser possível que a resposta seja sim às questões enunciadas, mas a estimação da probabilidade desta hipótese compete a cada um, pelas razões enunciadas acima. Chego, assim, pessoalmente, a mais uma

Conclusão intuitiva: Com elevada probabilidade, o conhecimento e o raciocínio são possíveis e estão ao alcance da mente humana, embora algumas questões possam ser indecidíveis.

No meio de alguma frustração, termino com uma nota de optimismo: se se der efectivamente o caso de a resposta ser sim às questões 1, 2 e 3, e confirmando-se a existência de questões que, não estando ao alcance da mente humana, não sejam, em si mesmas, indecidíveis, existe a hipótese de os humanos produzirem outros processos, ou outras mentes, que resolvam pelo menos algumas das restantes questões cujas soluções não são acessíveis a si próprios.